4/19/2007

Você tem fé em que?

"Sou wiccaniano, mas já fui evangélico, conheci a umbanda, visitei um templo budista, tenho amigos judeus, minha mãe é espírita e meu pai é muçulmano". Essa não é uma citação oficial, mas bem que poderia ser, afinal, hoje, no Brasil, além do catolicismo, há um amplo leque de opções para quem tem fé e quer colocá-la em prática junto a um grupo com o qual se identifique. Foi-se o tempo em que a população brasileira católica apostólica romana era quase unanimidade no País. "Se no passado havia entre 20 e 40 expressões religiosas, hoje, são centenas", revela o professor de Sociologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Alexandre Brasil, um dos responsáveis pelo estudo da Unesco (Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura) - Juventudes Brasileiras, realizado neste ano e que será lançado no próximo mês de novembro. Segundo ele, estima-se que, hoje, cerca de 40% dos jovens brasileiros sejam católicos, 30% evangélicos, cerca de 20% não tenham religião definida e, o restante se enquadre em outras crenças.
O crescimento da wicca, das diversas linhas do budismo, entre outras religiões com ascendência oriental ou pagã - embora tenham um percentual de seguidores ainda restrito - aponta um incremento da pluralidade religiosa do Brasil nos últimos 10 anos. Algo que é visto de forma positiva pelos especialistas. "A pluralização é sempre boa porque dá espaço para a diversidade. Dentro disso, haverá mais oportunidade para que as pessoas se relacionem com o sobrenatural", opina Brasil. A antropóloga, secretária adjunta nacional e presidente do conselho nacional da juventude, Regina Novaes, afirma que este movimento de pluralidade é positivo porque permite uma maior diversidade, o que incentiva a população não só a aceitar, mas também, a lidar com as diferenças. "Essa mudança proporciona o enriquecimento do ser humano a partir da diversidade", acredita.
Tal transformação foi impulsionada pela ação dos veículos de comunicação como a Internet, aliados a uma grande liberdade de escolha, decorrente de uma maior democratização da sociedade. Neste aspecto, principalmente os jovens entre 15 e 29 anos, que no passado "rezavam conforme a cartilha dos pais", passaram a escolher sua crença de acordo com suas próprias convicções. Nessa onda, embora os católicos ainda sejam maioria, a religião acabou perdendo muitos "votos".
Para o pesquisador, estas duas últimas categorias, são abrigadas por jovens que têm a marca da era moderna: questionar, questionar e questionar. "As pessoas se perguntam a todo momento: de onde vim? Por que vim? O que estou fazendo? E elas estão interessadas em encontrar coisas diferentes", explica. Fora isso, com o avanço da ciência, existem dogmas que ficam cada vez mais distantes da realidade e mais próximos de conceitos como o mistério e fé, o que desperta ainda mais a busca por respostas. "A idéia é ter experiências, isso também é uma marca da juventude, esta ânsia de buscar, experimentar e conhecer. No passado, isso tudo estava muito distante. Hoje, você entra no Google - o grande oráculo da era moderna - escreve a palavra 'religião' e vai aparecer um monte de opções", explica.
Regina defende que o grande traço desta geração é a questão de não reproduzir necessariamente a religião da família. Antes, grande parte dos jovens não concordava com a religião de seus pais, mas não tinha como dizer que eram de outra religião por falta de coragem de mudar. "Daí surgiu aquela história de católico praticante e não-praticante. Só uma minoria se considerava ateu ou agnóstico", lembra.
Mas, afinal, o que eles buscam?
Brasil explica que há duas razões para que o jovem participe dos movimentos religiosos: para preencher uma falta, e para se expressar. Os jovens vêem nos movimentos religiosos, um espaço onde podem ter voz ativa, dizer o que pensam e reivindicar aquilo que têm necessidade, além de trocar experiências com outros jovens. "Tanto na igreja católica, nas evangélicas ou nas outras religiões, a juventude é atuante. Para o jovem é muito importante sentir-se assim", diz. Segundo ele, nos movimentos religiosos é muito fácil encontrar um lugar em que o jovem é o protagonista e responsável pelas decisões. "Este estudo da Unesco motra que dentro das organizações religiosas boa parte das decisões se dão pelos próprios jovens", revela.
Jovens "sem religião"
"Cresceu expressivamente o número de jovens que dizem não ter nenhuma crença, mas não estamos falando só daqueles que não acreditam em nada, e, sim, do sincretismo religioso. Ou seja: daquele jovem que não tem só uma, mais várias religiões", afirma a antropóloga Regina, também autora do estudo - Os jovens "sem religião": ventos secularizantes, "espírito de época" e novos sincretismos.
Em sua opinião, hoje, o jovem tem um "cardápio" amplo de opções religiosas para se afiliar, por isso acaba fazendo uma síntese pessoal do que acredita. De manhã, ele pode fazer i-ching, à tarde, visitar um centro budista e, à noite, pode perfeitamente estar em uma reunião de jovens católicos. "Quer dizer, ele abre mão de ter uma vinculação institucional única e faz uma síntese pessoal da sua religiosidade e da sua forma de pensar as questões transcendentais. Isso é muito novo", explica a pesquisadora.
Em sua opinião, todas estas questões devem ser levadas em conta ao fazer uma avaliação sobre o envolvimento do jovem com a religião. "Se você pensar em termos de religião de família, certamente, em pleno século XXI, a participação do jovem diminuiu, mas se você levar em conta as escolhas pessoais, avaliando a questão do sincretismo religioso, pode-se, sim, dizer que aumentou", encerra.






Crescem religiões não-cristãs e o movimento dos "sem religião",
publicado em 10/11/2006, por Lilian Burgardt, encontrado no site: http://www.universia.com.br/html/materia/materia_bcecg.html